gabriele parte 2

Já se passavam das duas da manhã de uma sexta feira qualquer. Eu não saia de casa, nunca saia, não tinha motivos para isso, mas naquela noite eu senti que tinha de sair. Não estava frio, não ventava, era uma noite normal. No meio do caminho avistei uma ponte, alta, uma marginal passava por baixo. Achei o local ideal. Morrer aqui, se não morresse na queda seria atropelado por um dos caminhões que passava de tempos em tempos. Olhei para os lados, não havia ninguém, nenhuma pessoa, nenhum carro. Olhei para baixo e só caminhões passavam. Subi no vão da ponte, abri os braços como se mirasse para os lados, fechei os olhos, as vezes eu escutava buzinas, as vezes eu escutava o piar de pássaros noturnos. Quando minha mente parou de funcionar, quando nada mais me impedira de pular tirei um pé do vão da ponte e como se pisasse em uma pedra invisível coloquei meu pé nesse ponto onde embaixo só se via a marginal. Mas um vento soprou em mim, um vento que me fez abrir os olhos, eu olhava para o céu escuro e sem vida e do meu lado ouvi:
- se eu fosse você não pularia.

Uma voz doce, delicada, sensível. Eu poderia ter pulado, eu queria ter pulado, mas senti um assopro leve no ouvido que me fez sentir um calafrio, algo me fez olhar para o lado e foi a primeira vez que a vi. Loira, cabelos lisos, muito lisos, um rosto que nem a mais bela das mulheres teria e ela tinha, um sorriso delicado com um olhar caído, esse era a visão que eu tinha fatal a qualquer homem. Eu adorava mulheres com o olhar caído, aquele olhar que parece que os olhos estão se fechando, mas na verdade estão mais abertos que o normal. Adorava o sorriso dela sem mostrar os dentes. Estava muito perfeito. De onde ela veio? Por que falava comigo? Uma garota que poderia ter qualquer um, falando comigo o patinho feio?
Uma simples frase veio a minha mente naquele momento:
- por que diz pra eu não pular?
- não sei. A vida é curta demais para se desperdiçar assim, não acha?
- você sabe por que eu estou aqui? Sabe pelo que já passei?
- não.
- então. Acha que se eu quisesse viver estaria aqui?
- eu sei que não pulará!
- por que diz isso?
- por que eu estou aqui.
- e quem você é para tentar me impedir?
- sou apenas uma amiga que você poderá ter se descer daí.
- amiga? Mulheres não fazem amizades com caras como eu!!!
- não sou uma simples garota. Sou algo mais. Porque diabos eu estaria passando aqui essa hora, se não fosse para ajudar um desconhecido que por ventura poderá se tornar meu amigo e quem sabe meu melhor amigo, meu confidente. O mundo da voltas. Algo me fez estar aqui.
- não esta me convencendo.
- anda! Me de sua mão.

Pegar não mão dela? Eu sei que era depressivo, traumatizado com garotas, mas pegar na mão dela? Deixar de morrer só por causa de uma simples garota?
- vamos, me de sua mão.

Olhei para baixo, via o asfalto me esperando, frio, duro, olhei para ela e vi um sorriso e uma mão esticada. Pareciam dois lados da moeda, parecia Diabo versus Deus, e hoje eu sei que era exatamente isso.
- venha não vou te fazer mal.

Estiquei o braço, meus dedos pegaram à mão dela. Uma mão lisa, macia. Desci da ponte e um vento do nada surgiu para nos assustar.
- há ha. Isso sempre acontece.

Ventos não aparecem do nada. Ainda mais em uma noite calorosa como aquela. Ela riu do vento. Hoje eu entendo.
- você me deve uma.
- por quê?
- salvei sua vida.
- não pedi por isso.
- não seja pessimista. Venha vamos beber algo.
- não bebo álcool.
- nem eu. Venha.

A acompanhei por umas quadras. Ela sempre falando e eu só escutando. Era ótimo ouvir ela, isso me alegrava e fazia me esquecer do que estava prestes a cometer. Chegamos a um bar, estava cheio. Não gostava de multidões, parecia que todos olhavam para mim a ponto de quererem me pegar.
- não tenha medo. Essas pessoas só estão se divertindo.

Ela leu meu pensamento?
- estou sem dinheiro.
- eu tenho conta aqui. Não se preocupe.
- uma garota pagando a conta?
- século 21.
- hm hm hm
- a estou vendo um sorriso aí, estou?
- foi engraçado.
- o que quer?
- sei lá. O mesmo que você eu acho.
- tudo bem. Hermano!!

Um cara se aproximou da mesa, ela pediu dois lanches e dois sucos.

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